21º Ensaio Cultural - Invasão Alienígena

Era 30 de Outubro de 1938. Muitos americanos ouviam a rádio CBS. Ouviam a Previsão do tempo e logo depois um especial com Ramon Raquello e Sua Orquestra, que foi interrompido com notícias urgentes sobre explosões em Marte. Um famoso astrônomo, Richard Pierson, descarta a possibilidade de vida no planeta vermelho e pede paciência aos que isso estão especulando.

As razões de pânico, diante do depoimento do especialista, parecem ser mínimas. Porém, segue-se a notícia de que um meteorito de formato cilíndrico caiu na Nova Jersey. Revela-se que este na verdade é um ônibus espacial, dentro do qual há um marciano. Raios de calor desintegraram todos os próximos, inclusos os repórteres da CBS. 
O pânico se espalha. Pessoas ligam para seus vizinhos e familiares discutindo o que ouviram no noticiário. Se os alienígenas chegaram mesmo, o que deve ser feito?

Continuam as notícias, interrompendo-se a programação normal. Os ataques continuam. Há incêndios que obrigam uma ação mais efetiva do corpo de bombeiros. A Guarda Nacional americana entra em ação, mas não consegue controlar o ataque. O especialista que negava a existência de vida em Marte agora está nervoso e faz especulações sobre o funcionamento da tecnologia marciana.

O rádio noticia que pontes, prédios e usinas estão sendo destruídos pelos marcianos. O desespero apenas aumenta. Um ministro americano faz um pronunciamento sobre o caso e dá instruções à nação. Imediatamente, estabelece-se uma conexão direta com o campo de batalha, informando todas as novidades sobre o caso. Inicia-se a invasão dos marcianos em Nova York. Os informantes do rádio logo sucumbem ao gás venenoso liberado pelas máquinas alienígenas.



A essas alturas, muitos já estão procurando abrigo ou ainda a espalhar boatos sobre o que está acontecendo, levando a narração a um outro nível. Já não se sabia da veracidade dos fatos. Duvidava-se de algumas coisas, mas de tudo, seria possível? Afinal, era a própria humanidade cuja existência estava ameaçada. No desespero, acreditamos em tudo porque queremos nos salvar. Talvez não a humanidade e sim os americanos. E talvez não os marcianos e sim os alemães. Que era guerra iminente, não havia dúvidas.

A CBS estava ciente disso, então logo o povo foi informado de que aquilo era um trabalho de ficção. Contudo, muitos já não estavam mais com o rádio ligado para ouvir essa revelação e continuaram em pânico mesmo após o fim da transmissão. Não havia alienígenas. Era tudo obra de Orson Welles numa adaptação para o rádio de A Guerra dos Mundos de H.G. Wells.

Não faltaram processos judiciais para a CBS ou para Orson Welles. Todos foram rejeitados, exceto o de um homem que gastou na fuga dos marcianos o dinheiro que pretendia gastar em um par de novos sapatos. A esse homem, Orson Welles fez questão de pagar os sapatos.

Tudo foi muito bem arranjado com a CBS, como pudemos observar. É impossível não reconhecer Orson Welles como um gênio após esse acontecido. Sua fama decolou. Afinal, não é todos os dias que uma falsa notícia gera uma grande paranoia em mais de um milhão de pessoas e é revelada falsa a seguir. Isso mostrou como há uma confiança quase cega do povo na mídia, mesmo em casos pouco prováveis como uma grande invasão de marcianos que ninguém é capaz de ver.

Três anos depois de Guerra dos Mundos, Welles dirigiu o notório filme Cidadão Kane, um oceano para discussões sobre a mídia de massa e manipulação da opinião popular por meio dela. Sem dúvidas, Orson Welles sabia bem o que fazia e estava consciente de que todos os dias o mesmo era feito sem que ninguém percebesse. Se os meios de comunicação hoje noticiassem uma invasão alienígena, não tenho dúvidas que a histeria se repetiria. Somente alguns conseguiriam honestamente colocar isso em dúvida, quebrando momentaneamente o controle mental do Cidadão Kane. Diante de uma grande ameaça à vida como essa, mesmo quem estudou o caso para escrever essa coluna tremeria diante de uma notícia assim, para só depois começar a averiguar se é verdade.


Autor: André Marinho
Criação: 22/07/2012
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