3º As Histórias de Nossos Heróis - A Elfa


Sendo a primeira elfa morena e única que tive noticias até hoje, esta boba da corte dos mais lindos e maravilhosos reinos elfícos conseguiu nos tirar de lá após vender tortas de amora estragadas para os guardas e nos enfiar em um buraco de coelho que nos levou a passar alguns dias perdidos no Mundo das Maravilhas, país que a convenceu que o mundo das artes era o seu ramo e por isso hoje ela desafia a fome no papel de atriz em alguns grupos teatrais e sendo bolsista na UFRN.

Poucas histórias mechem com o meu estomago tanto como a de quando foi desafiado a encontrar as ruínas do portal de Valinor nas terras de areia que nem Tolkien ousou descrever. Na época não existia sociedade do anel, e muito provavelmente todos os heróis das lendas, que não os elfos ainda não haviam nascido. Eu estava de passagem, o mundo dos humanos estava um tanto que chato e eu corria grandes riscos de acabar enfiando porcas em uma fabrica inglesa se não tivesse caído em um buraco a caminho de uma vila druídica na altura da escócia. Mas isso não importa, fato é que fui para lá e cai em uma dessas tavernas de jogos de RPG, onde heróis (porque sair por ai matando pessoas e dragões e animais que estavam na deles é muito heroico  simplesmente são bêbados e fanfarrões e ficam em uma taverna esperando a morte chegar! Morte essa que geralmente vem vestida de vermelho e diz que um mal maligno se aproxima... Pois é... não foi bem assim que aconteceu comigo, mas quando entrei na taverna percebi uma criatura simplesmente linda! Uma elfa! Sabe, é um humano, melhor uma humana, com orelhas pontudas, pele sem espinhas, com umas duas costelas a menos e sem pelos na axila, porque na terra média isso era muito comum nas mulheres, e nojento, principalmente nas anãs que até bigode, não que em plena revolução industrial isso fosse diferente né, lá na terra média pelo menos elas tomavam banho, acho... Mas eu estou digitando do século XXI, e isso faz toda a diferença! Então, voltando, eu, franzino, barrigudo, feio (mentira...) entrei nesse antro maraaaavilhoso e imediatamente fui roubado por algum ladrão sem graça e safado que deve ter ficado muito irritado ao perceber que as moedas que eu carregava não eram bronze, nem ouro ou prata, e que logo por isso, não valeriam nada a menos que ele empurrasse para algum idiota como sendo um item sagrado de alguma divindade que existia na época... Bom, sendo ou não sendo assim, pouco me importa, sei que estando eu estonteado pela beleza da elfa maravilhosa, tanto que fui roubado, e me encaminhando para ela sou interrompido por um brutamontes armado até os dentes, com um sorriso rasgado por uma cicatriz da moda... Sério, cicatriz lá era tipo última tendencia, todos usavam! Bom, na minha cabeça já vinha a confusão dos princípios passados, mas pelo que entendi, o camarada só queria ajudar mesmo... Ele me segurou e murmurou com um silêncio latejante: "não se aproxime da elfa, ao menor contato flechas e espadas afiadas atravessam o pescoço daqueles que se metem com ela..." O que me fez estremecer, agradecer, e ficar por ali, averiguando que o peso das minhas calças havia sumido e que já não me restava nenhum item de troca, o que provavelmente me faria esmolar por ai, ou calotear alguém... "ladrão de araque" pensei... Mas ainda podia ficar pior, sempre pode... Na mesa do moço superdesenvolvido um ser pequenino vestindo uma cueca de metal sobreposta as calças, um gnomo ou halfling talvez, começou a contar uma história de terror, de horror, sobre a vez que os elfos perderam o portal para Arda, tornando apenas possível que estes voltassem para sua terra subindo os mares ao sul, em uma viagem sem volta. Uma triste história, mas encantada com guerras, lutas, dessas que só o cinema reproduz hoje em dia... Fato é que no papo todo eu me empanturrei de tatu assado e e bebi os últimos hidromel da região... Grande fanfarrão eu sou, pronto para dar no pé, não me avisaram que o gnomos não são engados por ninguém, e quando ia me virar para ir embora, fingindo ir no banheiro ou coisa do tipo, senti minha perna rígida e um frio penetrou minha espinha... "Não pretende pagar, senhor estrangeiro?" Eu virei para ele: "Como? Claro que pago, só vou no banheiro..." E ele se aproximou ao ponto que podia contar os fios de barba branca que saiam por debaixo de nariz de batata. "Eu não acho que você está com vontade de ir no banheiro..." Agora pronto, um cara que nem é homem pros lados dizendo querendo atestar minhas necessidades fisiológicas... Ainda mais que estava enganado, porque com aquele arrepio no ouvido e a tensão de ter alguém desconfiando de mim, o que eu mais precisava naquela hora era de um banheiro! Enfim, estava ferrado... pra variar... Mas podia ficar pior, e ficou! Ele falou algo como " tudo bem, eu pago essa, mas você tem que ir ao deserto de Enedwaith e me trazer um pedregulho qualquer da fortaleza arruinada, aceita?!" E eu fiquei olhando aquela criatura abissal, pensando comigo que história mias absurda era aquela, e eu pensei na super diversão que deveria estar sendo a Europa, e em como a minha eternidade havia sido chata quando eu tentava viver em sociedade, e decidi sorrir e dizer que aceitava! O que teria sido ótimo se ele não tivesse me feito selar a sangue o acordo mordendo o dedão da minha mão direita... Malditos gnomos canibais! Se bem que isso não é canibalismo tendo em vista que não sou da especie dele... Ahh, então aquela frase do gandalf no hobbit está errada, trolls também não devem ser canibais... eles comem gente! Ok, oks, vou me concentrar na história... Avançando um pouco, caminhei alguns dias, andei muito, fartamente alimentado por água e um saco de comida que afanei da estalagem onde dormi por conta do baixinho lá, que a essa hora já sabia tratar de um poderoooso sacerdote que gostava de tavernas e contar histórias, mas isso não foi o suficiente, para o deserto... Na nossa mente o deserto é sempre algo menor do que parece... esse não era diferente... Porque diabos iriam fazer um portal no meio do deserto! E se alguém pegasse esse portal desavisado? Morreria de sede por certo! Mas quem se importa, eu tinha um cantil infinito e como objetivo chegar ao tal portal, usando um mapa sem escala... Quando já estava tonto, com uma super insolação que me garantiu duas cirurgias de câncer de pele quando eu ainda era jovem para tal, e com fome a ponto de meu estomago doer muito, eu vejo, na noite, uma tempestade de relâmpagos e entre elas a silhueta de um castelo. Na minha cabeça aquelas ideias ignorantes de um cidadão qualquer achando que haveria água, comida... essas coisa.. E eu consegui correr para os relâmpagos... Tá, eu sei que isso não correto, mas eu tinha passado 4 dias com sol quente na cuca, em um lugar que o dia passa conforme quer... Era um castelo em ruínas, por fora um fosso já preenchido pelas areias do deserto, as paredes movidas pela erosão, o teto da fortaleza caído, com pequenas pontas do que um dia havia sido vigas de madeira... Até o aço estava erodido, modificado, a ponto de que eu não reconhecesse nada mais do que estava ali... Admirado pelas grandes paredes eu me encaminhava para o centro, pisando na areia fofa que me desnorteava... Estava escuro, e apesar dos relâmpagos, não chovia... Foi olhando para as paredes que tive certeza de onde estava. Cravado na parede por um metal prateado esverdeado que não se distorcera como os outros, estava um círculo quebrado, desenhado com milhares de hieroglifos quase que similares aos egípcios desenhos que me transmitiam a ideia de viajar, casa e mudança de lar... Então me abaixei ali mesmo e catei um pedregulho! O que teria sido bem objetivo se na hora de levantar eu não tocasse o metal esverdeado e tivesse a minha mais próxima experiencia do que imagino ser uma dose dupla de LCD depois de 20 mojitos na veia. Eu levei uma espécie de choque, e as coisas ficaram azuis, e de dentro do que deveria ser o portal eu vi uma moça aparecendo e desaparecendo, como os hologramas de hoje, só que lá não havia energia elétrica... Sei que aquilo foi me assustando e eu gritei meio que desesperado perguntando se ela realmente estava ali, se estava bem e todas aquelas coisas que pessoas sem noção da vida fazem, já que as que tem noção não vão para o meio do deserto com um saco de comida... Enfim, vamos ao clímax .. Estava eu, tenso, perguntando como ela estava a medida que percebia que minha mão estava presa no metal... E cada vez que eu tentava puxar com mais força a minha mão, mais ela era fixada ao metal, ao mesmo tempo que minha pele do antebraço começou a puxada e a da mão esquerda também e quanto mais aquilo me puxava mais corpóreo ficava a mulher... Até que ela tomou cor, e eu consegui ver seu corpo, era uma elfa de cabelos negros, ela estava presa lá, desmaiada, quando percebi que estava sendo sugado pelo metal, eu estendi meu braço para uma das pontas que se precipitavam pelas paredes com seus adornos... Seja lá onde aquilo ia dar, eu só não queria ir! Mas eu já estava mais dentro que fora, e por mais que tentasse, o máximo que fiz foi levar comigo resíduos verdes daquele metal... E quando tudo se fechou não havia oxigênio, e com a pressão sobre meus ouvidos eu apaguei, acordando apenas muito tempo depois em um local florido, cheio de flores, com uma canção de flauta dessas que dão ainda mais sono e o cheiro do orvalho... tudo lindo, menos a minha fome que agora rasgava o meu estomago em um ardor sem fim. E eu levantei, me deparando com elfos e mais elfos que me olhavam assustados a medida que eu andava até eles como um zumbie... E foram fugindo para um templo lindo, de mármore, que era mil vezes mais gostoso do que a ardida areia do deserto... Eu só queria comer, mas o que recebi foi um flecha entre minhas pernas, e dois soldados amadurados empunhando alabardas me cercando... Acho que teria morrido se não fosse uma palhaça, com um chapéu verde esmeralda e um sorriso apreensivo pedir que eles parassem... "-Ele é o estrangeiro que falei! o que me salvou do portal onde fiquei presa por milênios! Deixe-o em paz!", ahh que lindo seria se tivesse acabado assim, mas não... Um de cabelo branco, alto, vistoso se intrometeu dizendo. "-Enehpets Lu Ul Solecnocsav, este local é sagrado! Humanos ou qualquer outra raça não podem entrar aqui!" , e ela respondeu: "Mas ele me salvou! Deixe que ele fique pelo menos até eu acabar minha pena!" e outro de cabelos dourados, mais vistoso que todos, com uma tiara na cabeça falou, que fique então, mas cumprirá contigo a pena, sendo nosso palhaço até envelhecer e morrer!

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